Texto publicado dia 24/08 no site de Cultura Geral da Cásper Líbero, no link a seguir:
O longa O Ditador (The Dictador) mostrou ao mundo que vinha para causar quando sua estrela principal, Sasha Baron Cohen (de Borat),
caracterizado na cerimônia do Oscar 2012 como o tirano Aladeen,
derrubou um pó imitando cinzas no terno do apresentador de TV Ryan
Seacrest, em pleno tapete vermelho. A cena foi sem dúvida mais engraçada
que várias piadas ditas no momento da entrega dos prêmios e é repetida
em O Ditador – só que no filme o alvo do déspota é a delegação de Israel na ONU e não são “cinzas” que são jogadas.
Aladeen é um personagem excêntrico – tão excêntrico quanto as outras
criações de Baron Cohen, como Brüno ou Borat. Ele se diz um amado
ditador de um povo que “adora ser oprimido” e que está próximo – pelo
menos, aos olhos dos EUA – de ter armas nucleares. Assim, a ONU exige
que Aladeen compareça às Nações Unidas para prestar esclarecimentos.
Entretanto, ao chegar aos EUA – onde é recebido com muita hostilidade
pela população – tem sua barba raspada e é substituído por um sósia que
anuncia o fim da ditadura e o início de uma democracia (aliada
economicamente a interesses de empresas multinacionais e de outros
governos, como o Chinês). Irreconhecível, sozinho num país
preconceituoso e sem nenhum poder sobre a população americana, ele só
terá Zoey (Anna Faris, da série Todo Mundo em Pânico), uma mulher defensora dos direitos humanos e dos refugiados políticos (que, por sinal, odeia Aladeen), com quem contar.
Como já era de se esperar de Baron Cohen, seu novo filme trouxe novas
e hilárias situações escrachadas e absurdamente constrangedoras. Ao
contrário de Borat e Brüno, o filme agora é cem por cento roteirizado, e
não mais composto de situações “reais”, ou seja, filmadas com pessoas
comuns que não sabiam o que estava acontecendo. Embora isso possa trazer
uma dose ainda maior de inverossimilhança ao caricaturado personagem de
Cohen, o roteiro possibilitou a criação de diálogos e cenas muitas
vezes mais engraçadas que as dos antecessores, inclusive por parte de
outros personagens que não o principal. A piada não vem tanto do
constrangimento do choque cultural (embora Aladeen passe o filme todo
refletindo sobre isso – o que é muito engraçado) e sim de como situações
tão absurdas têm um fundo de verdade muito enraizado na cultura
globalizada atual.
Aladeen é o estereótipo de um ditador, em conjunto com a ideia de
“inimigo burro” dos EUA. Entretanto, ao longo da projeção, é por ele que
torcemos – e não pela instalação de uma democracia no país onde seu
poder absoluto está prestes a receber um fim. Talvez porque vivemos em
um momento de contestação do capitalismo, da política americana, em meio
à efervescência da primavera árabe e à contestação da hegemonia
estadunidense, mas principalmente porque o roteiro é muito bem
conduzido. Há a esperança de que até ditadores violentos e estúpidos
possam mudar. E assim Baron Cohen samba nos americanos ao propor que,
antes de eles apontarem o dedo para os outros, que apontem para si
mesmos. Na cena mais hilária do filme, Aladeen discursa sobre como é bom
uma ditadura, e, ao caracterizá-la, fala apenas de aspectos da
sociedade americana. Até onde a política arcaica e violenta de Aladeen é
diferente da norte-americana atual?
É com esse viés de contestação social e política que O Ditador
se sobressai e que, de uma comédia de humor negro e politicamente
incorreta, se torna uma obra que questiona e critica grandes assuntos da
atualidade. É por se constituir num corajoso tapa na cara da sociedade
americana que O Ditador se torna uma das maiores comédias recentes de Hollywood.
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