segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Holy Motors


O Surrealismo começou na França e se tornou uma vanguarda importante do cinema por meio, principalmente, do cineasta Luis Buñel (O Cão Andaluz), inspirado pelo Manifesto Surrealista de André Breton. A ideia era a arte menos como representação e mais como algo indefinido, abstrato, psicológico, liberto da lógica e da razão. Na atualidade, David Lynch (Cidade dos Sonhos) é conhecido por usar recursos surrealistas em suas últimas obras, donde se destaca o enigmático Império dos Sonhos. Holy Motors, do francês Leos Carax, não parece ser um filme dessa corrente de início, mas essa não tarda a se mostrar a característica mais marcante da obra, que integrou a competição de Cannes em 2012.

Na trama, Oscar (Denis Lavant) vai trabalhar numa limusine branca, onde descobre que tem nove encontros agendados. Ele aparenta ser um executivo comum até quando começa, dentro do veículo, a se transformar em outra pessoa. Para cada um de seus noves compromissos, Oscar reserva surpresas para os espectadores. No elenco, Eva Mendes e Kylie Minogue fazem pontas.

Por que ele faz o que faz ou quem o pagaria para fazer esses "trabalhos" são apenas algumas das milhares de perguntas que poderão passar pela cabeça de quem assiste ao filme, que, propositadamente, nem cogita entregar as respostas. Pelo contrário, a medida que o espectador vá formulando suas ideias sobre o sentido do que vê, novas informações são dadas e, novamente, mais perguntas serão formuladas. Esse recurso pode deixar perdido o espectador mais preguiçoso, entretanto, é o ponto alto do filme, pois o deixa muito intrigado e permite que ele participe muito na construção do significado da obra.

Sobre o que se trata o filme? Tudo, menos sobre um maluco dentro de uma limusine. É sobre cinema, com um ator desempenhando vários papéis, numa espécie de metalinguagem nonsense? É sobre a vida, nossas escolhas e suas consequências, o desejo de voltar e fazer tudo diferente? É sobre nós mesmos e nossas várias faces que compõe nosso caráter, o castigo de sermos quem somos em nossas próprias imperfeições? É sobre a sociedade capitalista, em que homens enlouquecem, banqueiros precisam morrer, o sexo é virtual, a ambição é o motor da vida, propagandas são postas até em lápides, é possível ter intimidade com alguém que não se sabe nem o nome, tudo algum dia fica obsoleto? É sobre religião ou a falta de?

Em suma, Holy Motors é um daqueles filmes que ou você ama, ou, odeia. É necessário atenção e criatividade para ligar os elementos e compor uma versão própria. O espectador decidirá sobre o que é o longa (se conseguir). A única coisa indiscutível: é um filme ousado e intrigante como poucos, onde o importante não é entendê-lo, o que é difícil em grande parte dos filmes surrealistas, e sim tentar. Lynch aplaudiria de pé.

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