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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Joy: O Nome do Sucesso



Após duas parcerias com Jennifer Lawrence e Bradley Cooper, em O Lado Bom da Vida e Trapaça, o diretor David O. Russell retorna com o seu bem-sucedido time de atores em Joy: O Nome do Sucesso, um ponto fora da curva na carreira de prestígio do diretor e de seu time de estrelas, que inclui também o veterano Robert De Niro. O longa-metragem escorrega com uma quantidade imensa de personagens mal aproveitados e um enredo pobre e sem sal. 



O filme é inspirado na história de vida da empresária e inventora Joy Mangano, com foco no desenvolvimento de sua primeira invenção, o Miracle Mop ("Esfregão milagroso", em português). A criação, lançada há 25 anos, permitiu que Joy se tornasse um case de sucesso do empreendedorismo norte-americano: hoje ela possui a patente de mais de cem produtos, incluindo os cabides Huggable Hangers, o artigo de maior venda da história da HSN (canal de televisão destino a venda de produtos). 

Mas nem sempre foi assim: no longa-metragem, Joy (Lawrence) tivera que abandonar os estudos para cuidar da mãe (interpretada por Virginia Madsen), que passa o dia trancada no quarto vendo novelas, e para tocar os negócios do pai, que tem uma oficina de carros. Além disso, ela tem que lidar com a presença constante do seu ex-marido, que está hospedado no porão da casa; com os afazeres domésticos; e, ainda, precisa cuidar dos dois filhos - tudo isso, é claro, sem dinheiro. Para completar, seu pai (De Niro) resolve voltar para a casa dela, pois está sem lugar para morar após terminar outro casamento.

Os últimos dois filmes do diretor foram marcados por personagens meio loucos e extravagantes. Aqui, Lawrence não repete o papel de desequilibrada: são os pais de Joy que são meio fora dos trilhos. Talvez por isso, essa seja a atuação menos impressionante da atriz, que ganha aqui um papel menor, apesar de ser ela a principal do filme e ter sido premiada no Globo de Ouro. Os personagens de De Niro e Madsen são muito mais interessantes e o longa-metragem poderia ser muito melhor se soubesse explorá-los com mais profundidade – eles são o único alívio cômico do filme, afinal, algo muito bem trabalhado em Trapaça e O Lado Bom da Vida, mas que aqui fazem falta. Por exemplo: quantas situações o roteiro, assinado por Russell e Annie Mumolo, poderiam ser criadas apenas a partir do fato de que o personagem de De Niro e o seu ex-genro são obrigados a viver juntos no porão? No início do filme, quando Joy divide o cômodo ao meio com um rolo de papel higiênico, a situação para a comédia, para o drama ou para a tragédia entre aqueles dois antagonistas está montada. Entretanto, aquilo não resulta em nada concreto para a trama.

O roteiro não só esqueceu a situação do pai e do ex-marido de Joy no porão, como criou um monte de personagens sem sal. A vilã do filme – a meia-irmã de Joy – sequer existiu na vida real. Para o que ela serve na trama? A avó, a narradora, também parece perdida no meio de tanta gente. E o encanador, bom, também está lá perdido nessa história, assim como a novela que passa na TV, completamente desconectada da trama.

Joy: O Nome do Sucesso sofre com o excesso de personagens – o que é uma pena, pois Russell se destacou anteriormente pela direção de atores e, em O Lado Bom da Vida, mesmo com um grande time de atores disputando uma mesma cena, conseguiu um resultado excelente. Aqui, o diretor se perde, e o filme resulta tão desinteressante quanto a programação de vendas da televisão.

O descaso com os coadjuvantes tem outro efeito grave: ele torna excessivo o foco na personagem de Lawrence. Talvez tenha a ver com o fato de que uma das produtoras do filme seja a própria Joy Mangano, o que torna compreensível que o longa-metragem, quando parece que vai acabar, dá um salto desnecessário para mostrar o quão incrível foi o futuro de Joy, a grande heroína do filme. Suspeito, para dizer o mínimo. Mas vale ressaltar que o diretor considera a personagem de Lawrence uma mescla da verdadeira Joy com todas as grandes mulheres da sua vida, o que é uma perspectiva interessante de olhar a personagem. 

O longa-metragem tem êxito em pelo menos uma coisa: além de ressaltar a injustiça que é designar às mulheres o papel de "dona de casa", ele mostra a importância da família para a realização pessoal do indivíduo. Afinal, embora seus familiares tenham atrapalhado mais do que ajudado, Joy não fez tudo sozinha. Poderia ter sido mais fácil com o apoio deles, mas talvez nada teria acontecido se ela não tivesse uma sala de estar abarrotada de gente para ver o seu esfregão sendo anunciado na TV.  

| Gabriel Fabri

Em tempo, no Youtube é possível ver a verdadeira Joy anunciando a sua primeira invenção:



terça-feira, 24 de novembro de 2015

Jogos Vorazes: A Esperança - O Final



Chega ao fim a maior franquia adolescente dos últimos anos, Jogos Vorazes, também a série com alguns dos filmes de ação mais inteligentes já feitos por Hollywood. A cada longa-metragem, a saga de Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) superou as expectativas e entregou um filme melhor que o outro. Com forte conteúdo político e muita ação, a série baseada nos romances de Suzanne Collins tem o seu derradeiro desfecho em Jogos Vorazes: A Esperança - O Final, segunda parte do último capítulo da trilogia. Apesar de não ser o melhor da franquia, mostrando alguns sinais de esgotamento, o filme entrega um final digno e fora do comum para a série. A direção é novamente de Francis Lawrence, que assumiu a franquia em Em Chamas.  

Essa segunda parte retoma o final do terceiro longa-metragem, em que Katniss foi agredida por Peeta (Josh Hutcherson), entregue ao décimo terceiro distrito com a sua memória confusa, e apenas a certeza de que sua ex-aliada era uma ameaça. Enquanto a guerra à Capital segue em curso, com mais distritos aderindo às forças rebeldes, a presidente Coin (Julianne Moore) pede que Katniss descanse. Ela, entretanto, tem outros planos: para por um fim no sofrimento de todos, Katniss vai matar o presidente Snow (Donald Sutherland). É a última chance do público de ver em cenas inéditas o ator Philip Seymour Hoffman, que faleceu antes de terminar as filmagens.        

Depois de três filmes, é de esperar que a série não tenha muito mais o que dizer. Após a excelente primeira parte, a expectativa para A Esperança - O Final era de muita ação. Estamos falando, é claro, de uma guerra que chega ao seu clímax e, a esse ponto, as reflexões que o filme poderia provocar sobre a sociedade midiática ou sobre autoritarismo, muitas vezes ditos em nome da "paz" ou da "segurança", parecem já ter sido aproveitadas com esperteza nos longas anteriores. Entretanto, o romance de Collins pedia um tratamento diferente - e como os filmes, todos eles, optaram pela fidelidade ao livro, o mesmo ocorre neste derradeiro capítulo. Ora, Katniss não é uma guerreira nesta guerra e, neste filme, ela não assume a posição de líder: ela anda às margens do confronto, com a sua equipe, atrás de um objetivo secreto, o assassinato do líder da Capital. 

Assim, os discursos estimulados de "vamos nos libertar da opressão" dão lugar a dúvidas e mais dúvidas, entre alguns obstáculos que o grupo enfrenta para chegar ao coração da Capital - sim, um novo Jogos Vorazes, mas dessa vez sem a necessidade de matar os colegas, embora haja a dúvida sobre confiar ou não em Peeta, um ponto forte na narrativa desse filme. E o brilhante final criado por Collins levanta mais questões a respeito do poder, do autoritarismo e da falsidade dos discursos que prometem o novo fazendo o velho. 

Quem pensou que veria um filme só com ação errou, pois, assim como no episódio anterior, a ação aqui é secundária. Na cena de ação mais importante do filme, a heroína não salva o mundo com o seu arco e flecha, e sim, corre sem rumo, e assiste a tudo com uma sensação de impotência. Katniss, personagem que revelou para as massas Jennifer Lawrence, uma das maiores atrizes da atualidade, é complexa, é humana. E o filme não falha nessa construção: por trás da imagem forte do Tordo, há uma pessoa como outra qualquer - ok, é uma mulher muito forte e corajosa, mas também tem os seus medos e as suas paixões. E por falar em paixões, até quem ela "escolhe", entre Peeta e Gale, é um ato político nesse filme, um detalhe que pode até passar desapercebido, mas que não deve.

O novo Jogos Vorazes, entretanto, pode deixar uma sensação de que algo ficou faltando. Justamente por não ter ação demais (o que tem é uma repetição mais chata dos filmes anteriores), ou um grande ato heroico, esperado por quem não leu o livro. Isso é somado a detalhes como a frieza na morte de uma personagem, que explode sem qualquer emoção, câmera lenta ou música melodramática - o que não é algo ruim, pelo contrário. Afinal, os filmes da franquia nunca foram como outros filmes de ação quaisquer. E nesta guerra, travada não mais na arena de um violento Big Brother mas na vida real, o glamour das batalhas não existe mais. Por que, enquanto acompanha a saga para matar Snow, o público se pergunta se aquele caminho é o certo a se trilhar. Vibrar com Katniss Everdeen fica mais difícil porque fica mais claro que ela, apesar de toda a sua coragem e autonomia, é em todo momento uma peça no jogo de alguém, mesmo que tente fugir disso. E o público, assim como a personagem, começa a ver que nem tudo é preto ou branco, vilões ou mocinhos, como se acreditava.  

| Gabriel Fabri          

domingo, 18 de maio de 2014

X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido




Por Gabriel Fabri

Muita expectativa cerca o novo filme dos mutantes da Marvel. Trata-se, afinal, da união do elenco principal com os atores jovens de "Primeira Classe" - tendo, na linha de frente, o personagem Wolverine (Hugh Jackman), que já ganhou dois longa-metragens próprios. Fazer essa mistura ser convincente não é tarefa fácil, mas "necessária" para o mercado de cinema. É a união das duas maiores estrelas da série, Jackman e Jennifer Lawrence (de "Trapaça"). Felizmente, o que resulta de "X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido", de Bryan Singer, é o mais empolgante longa-metragem da série.


Na trama, o planeta Terra foi transformado em um cenário apocalíptico. A guerra entre mutantes e humanos chegava ao ponto de quase extinção dos X-Men, devido à criação de robôs muito mais poderosos. Em meio a esse caos, a única solução foi enviar Wolverine através do tempo, para o ano de 1973. 50 anos no passado, o mutante deve convencer as versões mais novas de Charles Xavier (James McAvoy) e Magneto (Michael Fassbender) a impedir Mística (Jennifer Lawrence) de assassinar o criador das máquinas que desencadearão o fim do mundo como conhecemos. 

Embora surja com ares de novidade - a destopia futurista consolidada, a união de todos os mutantes e a viagem no tempo -, o novo X-Men continua apostando na fórmula que o consagrou: boas dozes de humor, muitas cenas de ação e um discurso muito positivo sobre, em suma, tolerância com os outros e aceitação de si mesmo. Esse é o "segredo" do sucesso da série. Elementos que aqui se apresentam de maneira ágil e envolvente.Um ponto alto é a divertidíssima sequência durante uma fuga no Pentágono, que acontece dentro de uma cozinha, logo no começo do filme. Uma fuga que, aliás, garante outros momentos hilários - sete filmes depois e os roteiristas ainda conseguem extrair algo de cômico dos super-poderes dos personagens.

A mistura dos elencos traz problemas, mas também é parte da solução. O acerto foi trazer ao passado apenas Wolverine, o mais "descolado" dos mutantes, tendo bastante química com os personagens mais jovens. O sarcasmo está presente até para tirar sarro da ideia de volta no tempo, que rende alguns bons diálogos. Wolverine, além do público, é o único que conhece como os personagens com quem dialoga estão mudados, no futuro.

O clímax é, talvez, o grande problema do filme. No passado, é realmente o momento mais empolgante do longa-metragem, decisivo. No futuro, soa desproposital - afinal, não é alí que se dará a solução do conflito. E o pior: tirando a mais que desnecessária participação especial de Hale Berry, a maioria dos mutantes desse futuro são desconhecidos do público, que não desenvolve por eles a menor simpatia - só conhecemos os seus poderes, apresentados no início do filme. Ou seja: "Dias de Um Futuro Esquecido" monta paralelamente o clímax de duas histórias, uma de longe menos importante que a outra. A ideia de um "24 Horas" com meio século de diferença até ajuda a aumentar a tensão, mas atrapalha o desenvolvimento desse final. Até por quê a ação do futuro não tem nada de empolgante ou de novo, ao contrário das cenas com o elenco jovem. Afinal, quem se importa com quem vai morrer no futuro, se o que acontece no passado vai mudar isso, inevitavelmente?

Apesar dos problemas, "X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido" é o mais empolgante e divertido filme da série. Deve agradar em cheio aos fãs. Estes terão que esperar por mais um longa-metragem, porém, para alguém explicar por que o Professor Xavier ainda está vivo em 2023, quando sabemos que o personagem foi morto e enterrado em "X-Men: O Confronto Final"... Está aí um possível pretexto para uma continuação.  

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Trapaça


Por Gabriel Fabri

Se o Oscar do ano passado foi memorável, certamente não foi pela disputa entre dois duvidosos filmes políticos na categoria principal. A consolidação de Jennifer Lawrence (Jogos Vorazes) no hall das grandes atrizes de Hollywood, pela sua atuação em O Lado Bom da Vida, foi o melhor - talvez o único - destaque da noite. Com oito indicações, o longa trouxe também mais prestígio a David O. Russell, que dirigiu um elenco de peso e garantiu sua segunda nomeação na categoria de Melhor Diretor. Agora, ele repete o feito com Trapaça, obra que divide com Gravidade, de Afonso Cuarón, o posto de líder de indicações na cerimônia de 2014. Novamente, a direção dos atores e seus respectivos trabalhos se destacam nessa charmosa e instigante comédia.

Ambientado na década de 1970, Trapaça conta a história de dois charlatões, o casal Irving (Christian Bale) e Sydney (Amy Adams), que vivem dando golpes com empréstimos e vendendo obras de arte, ora falsas, ora roubadas. O sucesso da dupla pode vir por água abaixo quando o agente do FBI, Richie (Bradley Cooper), obriga os dois a o ajudarem a alavancar sua carreira e dar um sentido a sua vida medíocre: usar as habilidades dos dois criminosos para pegar grandes figurões da sociedade americana, começando pelo prefeito de Nova Jersey.  Assim, o casal se livra da cadeia e o agente salva o mundo (e consegue o prestígio que almeja em sua profissão).

Nesse filme, O. Russell repete os feitos da sua obra anterior: a excelência na direção de atores e a facilidade em construir diálogos envolventes e personagens bastante complexos. Amy Adams brilha atuando não só para as câmeras, mas para o personagem de Cooper e para os alvos das investigações, tudo ao mesmo tempo e convencendo em todos os momentos. Nem o seu sensual e insistente decote consegue desviar a atenção que sua atuação conquista. Também não rouba a cena de Bale ou de Cooper, ambos excelentes em seus papéis, pois o afiado roteiro garante para cada um seus momentos de brilho e uma construção digna de ter todos esses atores concorrendo nesse ano. E, claro, não podemos esquecer de Lawrence: no papel de esposa de Irving, ela interpreta novamente uma personagem desequilibrada, com muita expressividade, e garante a veia cômica do filme.

David O. Russell se consolida como um grande diretor de atores, com cada personagem dando um show à parte. Essa é a principal qualidade de Trapaça, mas que, de fato, faz parte de um conjunto maior que funciona muito bem, resultando numa divertida e glamourosa comédia. Mantém um leve clima de suspense em toda projeção, menos pela expectativa do plano dar certo e o perigo iminente envolvido nesses jogos de poder, e mais pelo o triângulo amoroso no qual não sabemos exatamente as verdadeiras intenções dos personagens, sempre em conflito. A trilha sonora, que inclui canções de Frank Sinatra, Bee Gees e Donna Summer, não poderia deixar de ser mencionada, pois contribui para o clima glamouroso do longa. 

E, ao contrário dos outros dois filmes de cunho político que disputaram ano passado, Trapaça não se preocupa em construir heróis ou vilões, pois na política é sempre preciso fazer escolhas - mas, e quando todas as suas alternativas são, de alguma maneira, erradas? Um filme onde todos manipulam a todos e que não está nem um pouco preocupado em dizer até onde isso é certo ou errado. E assim, mostra-se inteligente o bastante para não cair no maniqueísmo ou no moralismo.

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domingo, 24 de novembro de 2013

Jogos Vorazes: Em Chamas



Por Gabriel Fabri

No início de 2013, a doutora pela USP Silvia Viana lançou, pela Boitempo Editorial, o livro "Rituais de Sofrimento", em que analisa produtos culturais, em especial os reality shows, como verdadeiros espetáculos de horrores, transformados em entretenimento. São, como o nome da obra deixa claro, rituais onde os participantes se submetem a sofrimentos, acompanhados por uma grande audiência. A nítida crítica de Jogos Vorazes a esse tipo de programa de televisão ressalta o caráter perverso e alienador dessa cultura, ao associá-lo com a manutenção de uma ditadura e elevar esses sacrifícios às próprias vidas dos participantes, tornando o vencedor não o único vitorioso, mas o sobrevivente. No segundo filme da franquia, Jogos Vorazes: Em Chamas, de Francis Lawrence, as cenas de ação se tornam mais empolgantes, mas nem por isso a crítica social e cultural é deixada de lado.

Na nova trama, Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence, vencedora do Oscar por O Lado Bom da Vida) está de volta ao 12º distrito, aonde aguarda o início de uma turnê com o colega Peeta (Josh Hutcherson), em que percorrerá todos os distritos de Panem, uma versão distópica de um Estados Unidos no futuro. A sua vitória na última edição dos jogos, marcada por provocações à ditadura em vigor, mudou o clima nas regiões mais pobres, e a ameaça de revolução torna Katniss uma figura perigosa, um símbolo de resistência que incomodará - e muito - os poderosos.

Agora, a espetaculização do sofrimento não é mais o foco principal, embora os indícios de uma mídia cínica e manipuladora, e a necessidade dos participantes de construírem versões falsas de si próprios para sobreviverem nela, estejam em forte evidência. A máscara da ditadura da Capital caiu, e a pior face dela é revelada: a repressão, a exorbitante desigualdade social, o caráter alienador dos jogos e o glamour sem sentido, até desconcertante, em torno dos vencedores. Curiosamente, coisas que vemos, em graus menores, na atualidade, no mundo inteiro.

Só todas essas questões envolvidas, que estão muito bem articuladas, já podem fazer o público pensar mais que em muitos filmes franceses ou iranianos, por exemplo. Todavia, é claro que grande parte delas devem ser creditas à autora do livro no qual o filme homônimo se baseia, Suzanne Collins. Mas as questões estão presentes, traduzidas de maneira clara, sem ser panfletária ou massante, para a linguagem cinematográfica. Em Chamas choca e entretém nos momentos certos, constrói uma trama complexa e envolvente e cria boas sequências de ação para nenhum outro blockbuster hollywoodiano botar defeito.

Interessante também pensar no caráter metalinguístico dos dois filmes. Ao mesmo tempo em que se critica a cultura dos reality shows, o próprio público do filme assiste aos rituais de sofrimento dos personagens, vibrando com a ''eliminação'' dos concorrentes de Katniss, atento a cada reviravolta. A diferença parece está em um fator que o próprio Em Chamas explica: a esperança, representada na personagem principal. 

Em tempo: recomendo essa música linda que faz parte da trilha do filme. Infelizmente, não toca nem nos filmes e nem nos créditos. Então, dê o play em "We Remain", da Christina Aguilera, abaixo:


segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

O Lado Bom da Vida



Após ganhar o Globo de Ouro de Melhor Atriz, Jennifer Lawrence fez uma participação especial no programa humorístico Saturday Night Live, onde "zombou" das suas concorrentes ao Oscar, premiação em que também é indicada. Para Naomi Watts, que concorre por O Impossível, a piada é de que "o impossível" também seria Watts superar Lawrence, enquanto para Jessica Chastain, de A Hora Mais Escura, o recado foi: "você capturou Bin Laden. Mas em Inverno da Alma, eu capturei um esquilo e o comi". A brincadeira toda partiu em referência ao discurso de agradecimento de Lawrence durante o Globo de Ouro, em que começou dizendo "eu superei Meryl (Streep)", veterana que também concorria na categoria. Famosa pelo blockbuster Jogos Vorazes, aos 22 anos Lawrence é indicada pela segunda vez ao prêmio com o filme O Lado Bom da Vida, onde, novamente, rouba a cena - mas agora, de um elenco de peso.

A trama, baseada no livro homônimo de Matthew Quick, conta a história de Pat Peoples (Bradley Cooper), que acaba de sair do hospício e precisa reerguer sua vida. Ele reencontra sua família renovado - lê clássicos da literatura americana, tenta ser otimista em qualquer situação e pratica exercícios de maneira que chega a ser obsessiva, tudo com o propósito de reatar seu casamento com Nikki. Na reconstrução de sua vida, é apresentado para a bela Tiffany (personagem de Lawrence), precisando lidar não só com seus próprios problemas e dificuldades, mas também com os dela e do próprio pai, protagonizado por Robert De Niro.

Em Inverno da Alma, quando concorreu ao Oscar pela primeira vez, Lawrence carregou o mediano filme nas costas, numa atuação impressionante do começo ao fim. Agora, ela divide os holofotes com outros três atores indicados nesse ano: Bradley Cooper, a australiana Jacki Weaver e De Niro, que não era indicado há 22 anos (a última foi por Cabo do Medo, em 1991). A atuação de Lawrence novamente impressiona num papel de uma pessoa problemática, mas muito forte e com muita vivência. Seu trabalho é cativante e muito memorável, resultando numa Tiffany encantadora. O diretor David O. Russell dirige muito bem o seu elenco e soube se aproveitar muito bem dele - o uso de planos fechados é constante. O close-up desafia ainda mais os atores e, se eles forem bons, permite que suas atuações envolvam ainda mais o espectador.

Russell, indicado a Melhor Diretor e também a Melhor Roteiro Adaptado, se sai bem transpondo o livro para as telas. Muita coisa muda de um para o outro. No romance, por exemplo, é um mistério o que Pat fez para ser internado (ou porque a música do Kenny G o atormenta tanto) - o personagem não faz ideia e só descobre no final. No longa, logo no começo sabemos o que aconteceu. Outra mudança é a maior presença do personagem de De Niro na trama, em detrimento de outros coadjuvantes, cujo time ganhou o reforço desnecessário de um policial. Por fim, o clímax do filme não é o mesmo do livro - uma inversão de fatores inteligente que contribuiu muito para o funcionamento da obra. A essência, porém, se mantêm a mesma, ou melhor, até se acentua: tratar da loucura a partir de personagens trágicos e problemáticos com sutileza e humor, sem cair no deboche, sem perder a ternura. É um drama muito denso levado no maior alto astral, do jeito que a vida deve ser. 

Se não fosse por seu elenco de alto nível, talvez O Lado Bom da Vida poderia ser considerado apenas mais uma comédia romântica hollywoodiana inspiradora. De fato, o filme é até certo ponto previsível. Entretanto, é impossível não se envolver rapidamente, não vibrar com seus personagens e não reconhecer que seu elenco leva a obra a outro patamar. Um patamar digno de oito indicações ao maior prêmio do cinema, inclusive o de Melhor Filme. Talvez esse seja improvável, mas Lawrence, que ganhou o Bafta nesse fim de semana, tem sua estatueta quase garantida.